segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Universidades cortam verbas para professores e instalações

Escolas não renovam corpo docente nem instalações, mostra inquérito do PÚBLICO
Nos últimos três anos, as transferências do Estado para as instituições de ensino superior têm vindo a diminuir e já não chegam para cobrir as despesas correntes. Às universidades e politécnicos públicos é-lhes pedido que recorram às receitas próprias para pagar despesas que, até há dois anos, eram da responsabilidade do Estado.

Ano após ano, as instituições queixam-se do subfinanciamento e vão adiando projectos "à espera de melhores dias", conclui-se num inquérito que o PÚBLICO lançou há um mês ao sistema público de ensino superior e a que responderam metade (15 em 30) das instituições. No próximo ano, a dotação final do Orçamento do Estado para o superior ascende a 1027 milhões de euros, mas a estimativa das despesas com pessoal é de 1282 milhões, o que significa que as escolas terão de recorrer a receitas próprias para suportar os custos. O défice de financiamento público e a falta de autonomia foram duas das deficiências detectadas pela Associação Europeia de Universidades numa avaliação, conhecido há um mês, feita a 13 instituições portuguesas. "Os encargos de 11 por cento devido à Caixa Geral de Aposentações e o aumento de 2,9 por cento para pagamentos de salários da função pública são dois exemplos de situações de constrangimento financeiro para os quais a universidade não encontrou solução", explica Ramôa Ribeiro, reitor da Técnica de Lisboa, em resposta ao inquérito do PÚBLICO.

O ex-presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, Luciano de Almeida, substituído no cargo na última sexta-feira, recorda que quando o orçamento para o próximo ano foi discutido com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) "constatou-se que, para que todas as instituições tivessem, em 2009, pelo menos o mesmo orçamento inicial que haviam tido em 2008, seria necessário que o plafond crescesse 32,4 por cento", ou seja, para 1289 milhões de euros, escreve num artigo publicado pelo Jornal de Negócios, a 21 de Novembro. As escolas confirmam. "Só nos últimos quatro anos, o Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa, em Lisboa, perdeu cerca de dois milhões de euros por ano, a que tinha direito", explica o presidente Luís Reto. Mas, no seu caso, a situação será corrigida em 2009.

Menos formação
Em 2009, o apoio que a tutela deu ao longo deste ano a algumas instituições poderá repetir-se. Guimarães Rodrigues, reitor do Minho, pergunta por que razão o MCTES diz que os salários e subsídios estão garantidos, quando os orçamentos atribuídos "não são reais", e que "fundamentação é adoptada na atribuição discricionária de 'complementos'" às instituições com maiores dificuldades. "É a menorização das instituições. É a autonomia que está em causa. É a sua capacidade para desenvolver uma gestão responsável e estratégica que fica hipotecada. É, também, um convite à má gestão e à desresponsabilização", critica.

Com menos dinheiro, a maioria das instituições reconhece que vai adiar projectos, quer de formação dos quadros como de renovação ou construção de novas instalações, o que põe em causa a qualidade do ensino. A impossibilidade de rejuvenescer o corpo docente preocupa o reitor da Universidade de Lisboa, António Nóvoa, tal como a não abertura de concursos para a promoção dos professores, acrescentam Mascarenhas Ferreira, reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, e Luciano de Almeida, do Politécnico de Leiria. Na Universidade do Minho e no Politécnico da Guarda não foram renovados vários contratos a professores e funcionários, lamentam Guimarães Rodrigues e José Manuel Mendes, os responsáveis máximos de ambas as instituições. E o Politécnico de Leiria e as universidades de Lisboa e Trás-os-Montes estão preocupados porque não vão poder adoptar medidas de apoio à aplicação do Processo de Bolonha, que prevê um novo paradigma de ensino.

No que diz respeito a infra-estruturas, edifícios em estado de degradação vão ficar por recuperar nas universidades da Madeira e na Nova de Lisboa; mas também será adiada a construção de novos espaços nos politécnicos de Portalegre ou Santarém.

Medidas difíceis
Para cumprir as suas obrigações, as instituições tomam medidas que consideram difíceis. "A decisão mais difícil foi a de utilizar saldos de algumas escolas para colmatar insuficiências financeiras de outras. Esses saldos eram a demonstração de que tinha havido boa gestão", diz Ramôa Ribeiro, reitor da Técnica de Lisboa, lamentando que, deste modo, "ficaram por cumprir projectos" que tinham como objectivo o reforço da coesão da universidade. A aposta é no aumento das receitas próprias e na partilha do financiamento com outras entidades, como ministérios ou autarquias, sugere António Rendas, reitor da Nova de Lisboa. Vítor Santos, presidente do Politécnico do Porto, revela que a sua instituição fez uma parceria "inédita" com a Câmara de Vila Nova de Gaia. O resultado são as novas instalações para a Escola de Tecnologias da Saúde.

FOTO: a antiga Escola Politécnica, um dos muitos edifícios da Universidade de Lisboa a precisar de obras de restauro.

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